A revolução silenciosa da pesquisa em uma organização

Almir Oliveira
4 min readMar 7, 2023

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Photo by Thiago Cardoso on Unsplash

Um dos maiores desafios para o sucesso de uma organização, seja uma área governamental, ONG ou empresa, é ter sempre apurada a capacidade de enxergar oportunidades, especialmente as que são discretas ou praticamente invisíveis, apesar de serem decisivas. Isto pode acontecer em relação a contatos, investimentos, contratações ou simplesmente na forma como a organização se orienta e desenvolve seu modo de existir.

Um ponto que vejo ainda bastante preterido neste sentido, é a valorização da pesquisa. Não me refiro a uma específica ou a uma situação em particular, mas à cultura da pesquisa em si, não porque é o meu meio de vida, mas por ser pesquisador, percebo a cada dia o quanto pode ser decisivo para o sucesso de um empreendimento, ou da organização como um todo, estar sempre conectado da maneira mais próxima possível ao seu cliente, usuário, fornecedor e aos seus funcionários, pois muitas vezes erros ou omissões aparentemente pequenos podem causar grandes perdas, muitas vezes invisíveis, outras vezes irreversíveis, não se tratando apenas de perder o que já foi conquistado, mas também aquelas oportunidades que são tangíveis e decisivas, mas que simplesmente deixamos passar batidas.

Eu posso me colocar como exemplo, pois em certo momento da minha vida, estive insatisfeito com a minha carreira e ainda assim não pesquisei novas oportunidades simplesmente por acreditar que elas não existiam ou não estavam ao meu alcance e deixei de conhecer anos antes a carreira de Ux Researcher, que hoje tanto admiro e valorizo, e posso ter perdido um tempo precioso da minha vida estudando e desenvolvendo, estando hoje muito à frente do que já conquistei profissional e pessoalmente.

Mas por que as empresas ainda investem tão pouco em pesquisa?

Esta é a pergunta de ouro, especialmente no Brasil, pois os resultados de um processo de pesquisa muitas vezes não são tão visíveis nos resultados financeiros, especialmente a curto prazo, a ponto de encantar os olhos da maioria dos detentores dos poderes de decisão, sejam diretores, acionistas ou Product Owners, por exemplo. Por isso, muitas vezes a pesquisa está entre as primeiras áreas a serem ceifadas em momentos de dificuldade, isso se a área já existir. Além disso, mesmo que a pesquisa seja implementada na organização, frequentemente é de maneira tímida, envolvendo poucas áreas ou stakeholders e tendo seus resultados pouco implementados nos produtos e processos e com constantes dificuldades de mostrar o seu real valor.

A final, por que pesquisar?

Como dito acima, a pesquisa pode trazer melhorias e oportunidades para a organização ou o produto, mas nem sempre estas são tão fáceis de perceber e de encantar como uma mudança no design ou facilitação no fluxo do usuário. Ser pesquisador é estar diariamente evangelizando o valor da pesquisa.

Tais melhorias na organização, são como cuidar constantemente da saúde física. Você não sente os benefícios acontecerem exatamente no momento em que está fazendo uma bateria de exames do check-up anual, muito menos quando corta o hábito de comer uma comida que é deliciosa, mas pouco saudável. Porém o seu corpo deverá te agradecer mais pra frente.

Da mesma maneira funciona quando a organização tenta implementar a cultura da pesquisa. Demanda parte sensível dos recursos, encontra resistência de parte dos funcionários e investidores, muitas vezes não mostra resultados a curto prazo. Porém, os produtos amadurecem melhor, conhecemos melhor o seu ciclo de vida, prevenimos erros, temos mais chance de antecipar prejuízos evitáveis e antecipamos tendências.

Ou seja, da mesma forma que o corpo, a organização vai agradecer pra frente por esta escolha, pois estará muito mais segura, madura e robusta, podendo diversificar ainda mais o seu leque de serviços, produtos e oportunidades.

Então, como se pode começar a pesquisar?

O processo de implementação da cultura da pesquisa não é simples, muito menos rápido, apesar de gratificante, e pode ser desenvolvido através dos seguintes passo:

  1. Pode-se começar em uma área mais sensível, como a de criação de produtos, sejam físicos ou digitais, ou na interação entre clientes serviços prestados. Desta maneira, as lideranças podem enxergar o valor agregado, gradativamente sentir o ambiente e entenderem quais próximos passos podem dar.
  2. O próximo passo (que já pode não ser tão rápido) é espalhar a prática da pesquisa por demais setores onde se notam a sua necessidade, onde ela ainda se mostra incipiente ou inexistente, desde produtos novos e investimentos futuros até a relação entre a empresa e seus funcionários, mediada pelo setor de Recursos Humanos.
  3. Quando a organização já está mais ambientada com a pesquisa e seus benefícios, é um bom momento para aprofundá-la na cultura local e transformar muitos dos funcionários não apenas em consumidores dos resultados, mas também em produtores, através da geração de pequenas pesquisas sob a supervisão de pesquisadores mais experientes, em uma rede de mecanismos e processos que chamamos de Research Ops, na qual há uma pessoa ou equipe habilitada para dar esta orientação dentro da organização, corrigir possíveis erros, ajudar em pontos de dificuldade e gerenciar a governança e a documentação.
  4. Além disto, estimular a troca de conhecimento adquirido e a valorização das pesquisas realizadas através de apresentações periódicas entre os diferentes times, mostrando suas conquistas e aprendizagens e a criação de workshops para que todos aprendam constantemente sobre novas técnicas e modelos disponíveis no mercado.

E depois? O que acontece?

Quando a pesquisa já está bem amadurecida na organização, não é possível dizer que o ambiente estará livre de problemas e imprevistos, mas muito provavelmente estará muito mais estável, previsível e maduro do que estaria se fossem seguidos outros caminhos, pois é muito mais fácil e gratificante planejar uma jornada com antecedência do que ficar refém de imprevistos e atrasos pelo caminho. Quão triste seria constatar que está na estrada errada depois de já ter rodado 200Km e ter perdido um dia inteiro?

A pesquisa não tem por finalidade trazer uma verdade incontestável, mas nos permite amadurecer o nosso pensamento e os nossos processos de decisão, a encontrar novas perspectivas e, muitas vezes, a sonhar sonhos mais bonitos.

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Almir Oliveira

Cientista Social de formação, Ux Researcher em constante aprendizagem, cinéfilo, apaixonado por comida e culinária, corredor que usa a corrida como terapia.